Amanda Bonatti
[Quem conta um conto aumenta um ponto] A noiva - Amanda Bonatti
Amanda
Bonatti
Alice, caminha. Começa assim, com passos lentos, não quer
sujar a barra do seu vestido, onde pérolas claríssimas fazem o único brilho da
estrada. Segura com as suas duas mãos delicadas o tecido esvoaçante que lhe
cobre o corpo jovem. Seu coração palpita fortemente, dando a sensação de que
seus passos pisam seu o próprio peito.
Sabe para onde está indo e nunca desejou tanto fazer este
percurso, só não entende porque está sozinha e já parece ser tão tarde.
Ao longe, escuta o trotar de cavalos, e por algum tempo somente este som ecoa
no vazio, acompanhado dos seus passos nas pedrinhas finas da estrada de barro.
Olha para todos os lados, nenhuma luz acesa indicando algum
morador próximo. Está realmente sozinha. O trotar dos cavalos desaparece e
Alice percebe que não vinham em sua direção, mas também não se recorda ter
passado alguém montado por ela.
A cada passo sua respiração torna-se mais difícil e
ofegante, seus pensamentos se confundem com sensações atordoantes, dentro da
escuridão flashes de um rosto perturbado, mas não conseguia entender, eram
cenas que vinham e iam com o piscar de seus olhos.
Alice olha então para seu vestido, lindo, costurado e bordado pela mãe e sua avó estava agora amarelado pelo pó da terra seca, todo o vestido estava sujo, e Alice começa a chorar.
Alice olha então para seu vestido, lindo, costurado e bordado pela mãe e sua avó estava agora amarelado pelo pó da terra seca, todo o vestido estava sujo, e Alice começa a chorar.
Sem perceber, inicia uma fuga desesperada, correndo tão
depressa que o suor começa a descer pelo seu rosto, tão depressa que já não
sentia mais suas pernas, seus pés e todo o seu corpo ficaram dormentes, então,
Alice cai, seu corpo desmaiado fica ali na beira da estrada.
O amor! Ah, o amor é a sensação mais sublime que a menina
Alice já experimentara e que lhe arrebatou o coração quando ainda era muito
nova. Devia ter uns doze ou treze anos, assim me disseram, quando se apaixonou
por Francisco.
Sua mãe, estranhou seu repentino interesse pela igreja, de
um dia para o outro passou frequentar a missa sem falta, todos os domingos pela
manhã, e o motivo era um só, Francisco estaria lá. Ele era coroinha e sempre
sorria quando Alice chegava, ela sabia - ele também gostava dela.
O amor juvenil começou a nascer e Alice e Francisco
começaram a trocar bilhetes com juras de amor. Desta fase ate virar um
compromisso sério foram menos de dois anos, e assim, ambos com quinze anos,
eram o casal mais feliz que se podia imaginar.
Cidadezinha do interior, logo todos ficaram sabendo do
romance e as famílias muito conservadoras em uma época em que os jovens casavam
- se cedo, logo trataram de combinar o casamento.
A data foi marcada para o fim da primavera e Alice e
Joaquim eram só felicidade.
Outros meninos também a cortejavam, muitos gostariam de
namorar Alice, de tão linda que era, com seus cabelos e olhos negros em uma
pela branca e jovem, porém, a menina só tinha olhos para seu eleito, Francisco
era único em seu coração.
Certa noite, em uma festa de igreja, Alice percebeu um
olhar mais intenso em sua direção, ela não conhecia, ele era mais velho e
parecia andar nas sombras, pois ela não conseguia ver o rosto do rapaz. Sentiu
medo, de um olhar tão intimidador, quase rancoroso que teimava em não desviar
dela.
O rapaz que estava sozinho, mal conseguia esconder seu
semblante amargo, raivoso. Ele não tirava os olhos de Alice, sumia e apareceria
onde ela estava, isso a assustou.
Ela o viu ainda mais algumas vezes, sempre sozinho,
olhando-a sempre sério, olhar fixo, depois sumia, para um próximo encontro, sem
que ela pudesse imaginar de onde vinha ou quem era.
Perto da data do casamento Alice recebeu uma carta anônima,
com letras trêmulas, que revelavam seu conteúdo.
"Alice, já não posso mais conviver com esta dor de ser
rejeitado, ver a alegria estampada em seus rostos enquanto choro o amargo do
desamor. Sempre te amei em silêncio, és minha, não percebes que não serás feliz
casando com outro?"
Alice sentiu um arrepio percorrer todo o seu corpo, aquela
carta ameaçadora, chorosa e intempestiva lhe tirou o chão. Sentiu medo, pânico,
não sabia o que fazer, nem ao menos sabia quem era o rapaz, que dizia ser
rejeitado. Rasgou a carta em um ímpeto de que aquilo não fosse real, estava
nervosa mas preferiu fingir que aquela carta nunca tinha chegado à sua mão.
Continuou os preparativos do casamento sem demonstrar nada
a seu noivo ou à família, ela estava tão feliz, radiante de alegria que não
deixaria que nenhum mal a abalasse.
No dia do casamento, Alice estava ansiosa, já imagina
Francisco à sua espera no altar, ia divagando em seus pensamentos enquanto se
arrumava em sua penteadeira.
Colocou o delicado vestido, os cabelos negros estavam
lindos presos no alto da cabeça e com apenas algumas mechas caindo sobre os
ombros, no rosto apenas um batom muito natural, a juventude corava a sua pele,
seus olhos iluminavam seu rosto inteiro, estava linda.
Sua mãe entregou - lhe o buquê de flores campestres e lhe
deu um beijo na face, guiando a menina até a charrete que a levaria a igreja.
Alice entrou na Charrete, acomodou - se virada de costas
para o cavalo e o "charreteiro", sua mãe entrou em seguida, de frente
para ela.
A estrada sinuosa, de barro, até que apresentava uma bonita
paisagem, cercada por árvores em vários tons de verde, algumas com flores,
brancas, rosas e roxas, também haviam várias plantações de cana e banana, uma
típica cidadezinha do interior, onde a menina foi criada desde pequena .
Era hora próxima ao entardecer, mas chegaria à igreja antes
que escurecesse, o caminho era um pouco longo, mas estava habituada a este
trajeto desde criança.
Apenas não gostava muito das ribanceiras à beira da
estrada, com pedras e em alguns trechos com rios, era um pouco assustador.
Em certo ponto da viagem a Charrete parou, e o homem
desceu. Alice e sua mãe pensaram que algo havia acontecido com o cavalo ou com
as rodas da Charrete.
Ah não! Ela pensou, não posso me atrasar, eu vou me casar
nem que eu tenha que ir andando o resto do caminho, meu amor está a minha
espera. - Alice pensou.
Mas, quando Alice olhou melhor, focando seus olhos no
Charreteiro quase teve um mal súbito. Abriu e fechou seus olhos pare ter
certeza que os seus olhos não estavam a enganando. Ali em sua frente, parado e
com um sorriso no rosto, estava o misterioso rapaz que perseguia Alice.
Provavelmente aquele que enviou a carta cheia de raiva, com
palavras ameaçadoras sobre o seu casamento. Afinal o que ele estava fazendo
ali? E ainda por cima sorria para Alice, como se estivesse feliz.
Porém seu sorriso revelava desespero e sarcasmo, ele desceu
e ficou fitando a menina demoradamente.
A mãe de Alice, se entender nada, desceu da Charrete e
perguntou:
- O que houve moço, porque paramos?
Mas ela não teve resposta, o rapaz pulou para cima da
mulher e empurrou em direção ao barranco, uma, duas vezes, até ter certeza que
a mulher havia desaparecido em meio ao mato e pó.
Alice gritava desesperada, desce da charrete e saltou para
cima do rapaz, com ódio, depois, correu para a beira do barranco onde ele
havia atirado sua mãe, conseguiu vê-la ao longe, tentando se levantar, mas
parecia estar muito machucada, haviam ali muitos galhos e pedras.
O jovem rapaz então, agarrou Alice pela cintura e a puxou
de volta para a charrete. Desta vez a conduziu na parte de frente,
segurando Alice com força, pelos braços e tentando se proteger dos pontapés que
a menina dava para tentar escapar e proteger - se.
O rapaz chicoteou os cavalos os fazendo correr muito rápido,
pegou uma estrada contrária ao caminho daquele que a levaria até a igreja,
neste momento já quase não se via mais sinais de dia, estava anoitecendo e o
céu passou para azul escuro.
- Alice, pare de tentar fugir, eu não queria te machucar,
mas você não me deu outra escolha, eu te amo Alice - O rapaz dizia.
- Deixe de ser louco, eu nem sei quem você é, me solta - Alice
chorava e gritava desesperada.
Quando viu que a noite tomou conta do céu, o rapaz parou a
charrete, Alice já estava quase desmaiada, sem forças de tanto que havia
gritado, chorado e tentado de desvencilhar do rapaz. Quando ele parou, ela
tentou pular e correr, mas caiu no chão de terra seca e sentiu que ele estava
atrás dela.
- Shhh, quieta
Alice, não grita não, não gaste essa voz linda com o vazio, com o eco da noite,
aqui não há ninguém, só nós dois - Ele falava enquanto cobria a boca da menina
com força.
Então ele a puxou para a beirada da estrada, e segurou nos
cabelos da menina com força, olhando-a nos olhos. Tentando alcançar a sua boca
para beijá-la - Pare com isso! - Ela dizia, trêmula, em pânico.
O rapaz, transtornado, puxou as alças do vestido da menina,
e com as mãos em suas costas arrancou os botões que o fechavam na parte
de trás. Ele não teve pena, machucou, feriu mais que o corpo, corrompeu a alma
da menina, da noiva que amava Francisco, da menina que sentia um amor puro e
delicado. Quando Alice viu que não podia mais, que não escaparia, entregou - se
como uma folha morta caída ao chão, deixando apenas as lágrimas correrem em sua
face.
O rapaz quando a viu parar de lutar, parou de violentar a
garota e a olhou, ele estava exasperado, respirava forte como quem acabava de
correr por quilômetros.
- O que foi minha menina? Alice? Você me entende? Entende
Alice, o tempo em que a amei em silêncio, o quanto te desejei... Alice?
O rapaz não entendeu, achou que ela havia desmaiado, mas
não, ela estava de olhos abertos, serena e resignada, olhava para o céu como se
estivesse procurando alguma estrela, nos seus olhos, gotas de lágrimas cresciam
e escorriam até a sua boca.
- Meu amor, eu não demoro, Francisco, eu vou meu amor, me
espera, que eu te amo, amo tanto. - Alice disse chorosa.
Os olhos do rapaz viraram brasa, em seu peito queimavam
chamas de ódio e rancor, sentiu - se frustrado e desafiado. Apertou com força o
pescoço da menina. Isso não podia ficar assim, ela estava ali com ele e
pensando em outro, nunca entenderia que ele a amava de verdade?
O rapaz ia alimentando seu ódio enquanto sufocava e
apertava com mais força até que percebeu que a menina não mais respirava. Então
ele se atirou sobre o seu corpo seminu e começou a chorar, não que tenha se
arrependido, mas desejou morrer por não ter mais Alice para contemplar, para
amar, mesmo que de longe.
Pensou em se atirar do barranco, no entanto era muito
covarde para isso, talvez nem morresse. Então ele a vestiu, tentando escondeu a
nudez da menina, cobriu seu rosto com o véu branco transparente e fugiu.
Fugiu com o cheiro e com o sangue da Menina, com suas
lágrimas e seus sonhos. Em sua carne estavam as marcas das unhas, e em seu
coração, as marcas do abandono e da rejeição.
***
A noiva então, desperta, começa assim, com passos lentos,
não quer sujar a barra do seu vestido, onde pérolas claríssimas fazem o único
brilho da estrada, então, segura com as suas duas mãos delicadas o tecido
esvoaçante que lhe cobre o corpo jovem, seu coração palpita fortemente, dando a
sensação de que seus passos pisam seu o próprio peito.
Sabe para onde está indo e nunca desejou tanto fazer este
percurso, só não entende porque está sozinha e já parece ser tão tarde.
Ao longe, escuta o trotar de cavalos, e por algum tempo
somente este som ecoa no vazio, acompanhado dos seus passos nas pedrinhas finas
da estrada de barro.
Olha para todos os lados, nenhuma luz acesa indicando algum
morador próximo. Está realmente sozinha. O trotar dos cavalos desaparece e
Alice percebe que não vinham em sua direção, mas também não se recorda ter
passado alguém montado por ela.
Vê um carro se aproximar, levanta os braços e se põe na frente
para fazê-lo parar, mas ele passa por ela como se a menina fosse invisível.
Decide continuar, a cada passo sua respiração torna-se mais
difícil e ofegante, seus pensamentos se confundem com sensações atordoantes,
dentro da escuridão flashes de um rosto perturbado, mas não conseguia entender,
eram cenas que vinham e iam com o piscar de seus olhos.
Alice olha então para seu vestido, lindo, costurado e
bordado pela mãe e sua avó estava agora amarelado pelo pó da terra seca, todo o
vestido estava sujo, e Alice começa a chorar. Sem perceber, inicia uma fuga
desesperada, correndo tão depressa que o suor começa a descer pelo seu rosto
coberto com o véu. Corre tão depressa que já não sentia mais suas pernas, seus
pés e todo o seu corpo ficaram dormentes, então, Alice cai, seu corpo desmaiado
fica ali na beira da estrada.
Assim me contaram e tal qual lhes contei, que nas noites
mais escuras que se possa imaginar, quando não há sequer uma estrela iluminando
o céu, um vulto branco atravessa a noite rasgando a escuridão.
É ela, a noiva sem rosto, que corre desesperada rumo à
pequena capela, para encontrar seu amor. Conta-se que muitos moradores,
assustados, preferem fazer outra rota, mesmo que mais distante, pois a noiva
muitas vezes aparece dentro do carro. Os desavisados que por ali fazem
passagem, fazem uma só vez na vida.
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